Os Infiltrados
The Departed – Martin Scorsese – 2006 (DVD)
"Quando você decide ser alguém, você pode. Isso é o que eles não te dizem na Igreja. Quando eu tinha sua idade eles diziam que poderíamos nos tornar policiais, ou criminosos. Hoje, o que estou dizendo para você é: Quando você está com uma arma carregada apontada para sua cara, qual a diferença?"
Ouvir essas palavras na inconfundível voz de Jack Nicholson, ao som de Gimme Shelter dos Rolling Stones, e ver o letreiro indicando um filme de Martin Scorsese é o sonho de qualquer cinéfilo, e uma das grifes mais conhecidas da história da 7ª arte.
Passada a fase da revolta, que você poderá ainda conferir aqui, eu passo a enxergar o filme de outro jeito, talvez não como uma cópia de Conflitos Internos (2002), mas como um distanciamento do velho cineasta norte-americano de seu estilo consagrado. Claro que ainda temos luzes nos frames de Scorsese, mas aquela pegada firme de um Travis Bickle (Robert De Niro) é superficial.
O sarcasmo do gangster Frank Costello (Jack) apesar de ganhar a autenticidade inquestionável do ator, ressente de uma história mais verídica e dimensional, como a de Henry Hill (Ray Liotta) e sua guinada para o mundo do crime, ou até mesmo a do boxer Jake LaMotta (De Niro) rumo a autodestruição.
Tudo bem, o Costello é realmente uma personagem do maravilhoso mundo Scorsesiano, até alguns outros, mas não temos como separar Ace Rothstein (De Niro) do “fiel escudeiro” Nicky Santoro (Joe Pesci), um não vive sem o outro, e o outro precisa desse um. Já passou pela sua cabeça como seria o encontro de Frank Costello com o Nicky? Sabemos que o mafioso de Pesci viria com uma caneta, ou um porrete, ou uma 45, ou uma AK47, ou uma granada, ou, na pior das hipóteses, com dentes afiados e uma boca sedenta. Talvez o problema seja esse, por mais que o diretor no mostre a personagem de Nicholson, nós ainda não saberíamos como ele se comportaria, eu arrisco que ele chamaria seu guarda-costas Mr. French (Ray Winstone). O que seria uma decepção.
Outro questionamento fácil é sobre a psicologia da psicóloga (ops) de Harvard, Madolyn Madden (Vera Farmiga). Ela é infiel, indecisa e abstrata, apesar de ser quem é. Eu diria que ela não tem um palmo da densidade de uma Ginger (Sharon Stone), uma mulher que se casou por pressão e foi se destruindo nas drogas, nas relações e na traição, levando junto um time de mafiosos da pesada. Ou até mesmo uma Alice (Ellen Burstyn), que sempre pintou um mundo cor-de-rosa até ficar viúva, ainda jovem e com um filho.
Poderíamos sugerir alguma personagem cheia de dualidade, alguém que você tenha medo de talvez achá-lo engraçado. O Sargento Dignam (Mark Whalberg), que tem cara de desconfiado poderia ser o nome, mas fica difícil diante de um Tommy DeVito (Joe Pesci) e aquele – Você me acha engraçado? Me diz o que tem de tão engraçado em mim, porra!
E que tal Billy Costigan (Leonardo DiCaprio)? Ele parece temer o mundo como um Paul Hackett (Griffin Dunne) teme a noite de NY. Mas ele é um policial treinado e um gangster em formação, o que há com ele? Isso explica também um pouco do nervosismo de Sullivan (Matt Damon), que de cara se percebe que nunca encontrou um Frank Costello pela frente, alias, nenhuma personagem parece ter dado de cara com ele, a não ser as duas moçoilas de corpos esculturais embainhadas em cocaína, típico de Max Cady (De Niro), que se fosse chegado a entorpecentes, faria o mesmo com Danielle (Juliette Lewis) e Leigh (Jessica Lange).
"Quando você decide ser alguém, você pode. Isso é o que eles não te dizem na Igreja. Quando eu tinha sua idade eles diziam que poderíamos nos tornar policiais, ou criminosos. Hoje, o que estou dizendo para você é: Quando você está com uma arma carregada apontada para sua cara, qual a diferença?"
Ouvir essas palavras na inconfundível voz de Jack Nicholson, ao som de Gimme Shelter dos Rolling Stones, e ver o letreiro indicando um filme de Martin Scorsese é o sonho de qualquer cinéfilo, e uma das grifes mais conhecidas da história da 7ª arte.
Passada a fase da revolta, que você poderá ainda conferir aqui, eu passo a enxergar o filme de outro jeito, talvez não como uma cópia de Conflitos Internos (2002), mas como um distanciamento do velho cineasta norte-americano de seu estilo consagrado. Claro que ainda temos luzes nos frames de Scorsese, mas aquela pegada firme de um Travis Bickle (Robert De Niro) é superficial.
O sarcasmo do gangster Frank Costello (Jack) apesar de ganhar a autenticidade inquestionável do ator, ressente de uma história mais verídica e dimensional, como a de Henry Hill (Ray Liotta) e sua guinada para o mundo do crime, ou até mesmo a do boxer Jake LaMotta (De Niro) rumo a autodestruição.
Tudo bem, o Costello é realmente uma personagem do maravilhoso mundo Scorsesiano, até alguns outros, mas não temos como separar Ace Rothstein (De Niro) do “fiel escudeiro” Nicky Santoro (Joe Pesci), um não vive sem o outro, e o outro precisa desse um. Já passou pela sua cabeça como seria o encontro de Frank Costello com o Nicky? Sabemos que o mafioso de Pesci viria com uma caneta, ou um porrete, ou uma 45, ou uma AK47, ou uma granada, ou, na pior das hipóteses, com dentes afiados e uma boca sedenta. Talvez o problema seja esse, por mais que o diretor no mostre a personagem de Nicholson, nós ainda não saberíamos como ele se comportaria, eu arrisco que ele chamaria seu guarda-costas Mr. French (Ray Winstone). O que seria uma decepção.
Outro questionamento fácil é sobre a psicologia da psicóloga (ops) de Harvard, Madolyn Madden (Vera Farmiga). Ela é infiel, indecisa e abstrata, apesar de ser quem é. Eu diria que ela não tem um palmo da densidade de uma Ginger (Sharon Stone), uma mulher que se casou por pressão e foi se destruindo nas drogas, nas relações e na traição, levando junto um time de mafiosos da pesada. Ou até mesmo uma Alice (Ellen Burstyn), que sempre pintou um mundo cor-de-rosa até ficar viúva, ainda jovem e com um filho.
Poderíamos sugerir alguma personagem cheia de dualidade, alguém que você tenha medo de talvez achá-lo engraçado. O Sargento Dignam (Mark Whalberg), que tem cara de desconfiado poderia ser o nome, mas fica difícil diante de um Tommy DeVito (Joe Pesci) e aquele – Você me acha engraçado? Me diz o que tem de tão engraçado em mim, porra!
E que tal Billy Costigan (Leonardo DiCaprio)? Ele parece temer o mundo como um Paul Hackett (Griffin Dunne) teme a noite de NY. Mas ele é um policial treinado e um gangster em formação, o que há com ele? Isso explica também um pouco do nervosismo de Sullivan (Matt Damon), que de cara se percebe que nunca encontrou um Frank Costello pela frente, alias, nenhuma personagem parece ter dado de cara com ele, a não ser as duas moçoilas de corpos esculturais embainhadas em cocaína, típico de Max Cady (De Niro), que se fosse chegado a entorpecentes, faria o mesmo com Danielle (Juliette Lewis) e Leigh (Jessica Lange).
Por fim ainda espero o grande confronto de Billy e Sullivan, o gangster-policial, contra o policial-gangster. Mas seria pedir muito se fosse algo como Fast Eddie Nelson (Paul Newman) e Vincent (Tom Cruise)?
E olha que nem falamos da parte técnica. Mas quer saber? Scorsese por Scorsese, ele é gênio e com gênios não se discute.
Comentários
Falando de "Os Infiltrados": assisti recentemente ao filme "Conflitos Internos" e acho que "Os Infiltrados" consegue melhorar - e muito - o filme original. A trama de William Monahan é desenvolvida de uma maneira muito melhor que a do filme de Hong Kong. E, Scorsese, bem, como você mesmo disse, ele é um gênio e eu vejo em "Os Infiltrados" aquela marca que a gente identifica logo em outros filmes dele.
Abraço!
Mas vc foi brilhante em seu texto. Parabéns!
Abs!
Bah Cassiano, ficou espetacular essa viagem pelos filmes do Scorsese. Tu praticamente me obriga a salvar e guardar tudo. Nota 10 mesmo.
Saudações tricolores e um abraço!
Vinicius, concordo contigo.
Otávio, sei sim o que pensa do filme e respeito. Obrigado pelo elogio.
Marcus, obrigado amigo gremista! Confortably Numb tb é sensacional da trilha! Sou fã do Van Morrison!
Parabéns Cassiano,
Concordo com a Camila. A brincadeira entre as carências deste filme, e o que sobra em toda filmografia do Scorsese ficou muito legal; e acaba reforçando o que sabemos: O Oscar de Scorsese é pelo conjunto da obra e não pelo filme em si.
Abraço e até mais!